Série “Mulheres de Ciência” para reverenciar o 8 de março, Dia Internacional das Mulheres
Juciana Oliveira Sampaio
Possui doutorado, mestrado e graduação em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Estada de doutoramento na Écoledes Hautes Études en Sciences Sociales (Paris). Atualmente é professora de Sociologia e Metodologia Científica do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão. Coordena o Grupo de Pesquisa Múltiplos Saberes e Produção das Diferenças na Contemporaneidade – GPMULTI/IFMA/CNPq. É pesquisadora do Grupo de Estudos de Gênero, Memória e Identidade – GENI/UFMA. Tem experiência na área de sociologia, com ênfase nos seguintes temas: gênero, sexualidades, travestilidades, educação, memória, estudos queer e biográficos.
“Primeiramente, é necessário entender que a ciência é uma invenção social, historicamente situada, permeada por relações de poder e impregnada de valores. A partir dessa compreensão, a ciência é vista como uma série de conhecimentos que não são plenamente neutros, universais e objetivos, mas resultado de pontos de vista de sujeitos múltiplos, marcados por diferenças de gênero, raça, classe social, geração, localização. Existe uma larga tradição de estudos de gênero e ciência, de perspectiva crítica e feminista, que denuncia a construção da ciência enquanto uma verdade absoluta, afirmando que ela foi moldada por valores culturais que excluem e invisibilizam as mulheres como produtoras de conhecimento. A “ciência universal” seria, então, masculina, branca, burguesa, ocidental e heteronormativa. A análise do papel da mulher na produção da ciência deve passar por questionamentos dos próprios fundamentos da ciência moderna, do seu caráter androcêntrico, da sua linguagem sexista e dos preconceitos embutidos na socialização dos sujeitos que fazem a ciência, que selecionam os objetos e as práticas de análise. Estudos recentes apontam para o crescimento do número de mulheres nas ciências. Ainda assim, continuam como minoria, especialmente em áreas tradicionalmente masculinas, as ciências exatas e da natureza. Eles também mostram permanências a nível estrutural, como dificuldades de ascensão na carreira acadêmica, pouca produtividade, presença minoritária em cargos de chefias. Para analisarmos as reais transformações, devemos direcionar o olhar não somente à ciência feita por mulheres, mas para a produção científica sobre e para mulheres, uma vez que as disciplinas acadêmicas modernas excluíram mulheres e demais “minorias” (negros/as, deficientes, LGBTI, indígenas, dentre outros) de suas representações. O aspecto meramente quantitativo não é suficiente para concluirmos que as desigualdades de gênero na ciência estão desaparecendo. Para que aconteça uma transformação significativa, a própria forma de fazer ciência, sua estrutura e as epistemologias tradicionais que a sustentam devem ser questionadas. Não basta denunciar a reduzida presença de mulheres na ciência ou a invisibilidade daquelas que conseguem se sobressair em searas de predominância masculina. O gênero deve ser inserido enquanto uma categoria de pensamento e de análise na reformulação do conhecimento, diante da necessidade de criação de novas epistemologias para a produção de um conhecimento comprometido. Há fatores sociais que estruturam o descompasso entre homens e mulheres na ciência. Além das questões epistemológicas apontadas acima, as mulheres, tradicionalmente, são relacionadas à esfera privada, cuidados com o lar e filhos, identificadas por características de fragilidade, sensibilidade, amorosidade e até incapacidade intelectual. E, mesmo quando adentram o meio acadêmico e o mercado de trabalho (esfera pública), se inserem, via de regra, em áreas relacionadas a esses atributos de cuidado, em setores de serviços, assessoria, licenciatura, enfermagem, serviço social, psicologia e secretariado. Sem falar na dupla jornada (acúmulo de carreira e atividades domésticas) que dificulta ainda mais sua consolidação enquanto profissionais e produtoras de conhecimento”.