A leitura como ferramenta para o desenvolvimento humano

Por Silen Ribeiro 23 de abril de 2019

Por: Silen Ribeiro

 

 

23 de abril: Dia Mundial do Livro. A data instituída em 1995 pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) foi a escolhida por marcar o aniversário de morte de dois grandes nomes da literatura universal, William Shakespeare e Miguel de Cervantes, e visa, em especial, fazer com que as pessoas possam refletir sobre a importância do livro.

Nesta entrevista concedida à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Maranhão – FAPEMA, a graduada em Letras, mestra em Cultura e Sociedade, doutoranda em Literatura (bolsista pela FAPEMA), e professora assistente da Universidade Federal do Maranhão, Claudia Letícia Gonçalves Moraes, fala sobre a leitura e a sua importância como instrumento para o desenvolvimento humano. Vale a pena conferir!

O brasileiro tem o hábito da leitura?

O brasileiro ainda está no processo de adquirir o hábito da leitura. Uma pesquisa de 2018, divulgada pelo Instituto Pró-Livro (IPL), indica que a leitura é um hábito de 56% dos brasileiros. Em média, os entrevistados disseram ler 2,54 livros nos três meses anteriores à realização da pesquisa.  Assim, de acordo com o levantamento, 44% da população não lê e 30% nunca comprou um livro. Esse cenário atual vem de um contexto explicado no nosso passado: historicamente nossa imprensa só foi consolidada com a chegada da família real, no século XIX, e as políticas educacionais também demoraram muito a se consolidar, o que significou que durante séculos grande parte da nossa população foi analfabeta. E mesmo nos dias de hoje ainda temos um índice elevado de analfabetos funcionais.Assim, nesse cenário de desigualdades sociais e de defasagem educacional é complexo pensar em um país de leitores, ainda mais conhecendo a realidade dos preços do mercado editorial: para muitos brasileiros o livro é um artigo de luxo. Uma das saídas para dirimir esse problema seria investir em bibliotecas, espaços democráticos de acesso aos livros, à leitura e à informação de uma maneira geral. Outro papel importante, e voltamos ao começo, é o da família e o da escola na formação de leitores. O gosto, ou hábito, da leitura pode ser formado desde muito cedo, com o contato direto com o texto, principalmente literário, que se mostra mais atraente para estes leitores.

 

É importante, então, que o hábito da leitura seja estimulado desde a infância. Como isso pode e deve acontecer?

Para que o hábito seja consolidado é fundamental que comece desde a infância. Nesse ponto observamos como o papel da família e do Estado são cruciais para isso, ou seja: ler para os filhos, ajudá-los na escolha dos livros que pretendem ler, contar histórias na primeira infância, no caso da família, e investimento na formação de leitores tão logo essas crianças ingressem na escola, tudo isso contribui para que o hábito da leitura, cuja consolidação se dá ao longo da vida escolar, se torne uma constante na vida dessa criança que, mais tarde, será um potencial adulto leitor.No caso das escolas, que é a instituição onde nossos alunos passam uma parte considerável de seu tempo, é importante destacar também o papel dos professores como constantes entusiastas da leitura, em todas as matérias possíveis: não apenas na aula de língua portuguesa, mas em toda e qualquer matéria que exija do aluno a habilidade de interpretação textual e que estimule a leitura como parte fundamental da ambiência escolar. Para tanto, é importante também que o próprio Estado tenha interesse em investir na formação dos professores, pois são eles que vão atuar na ponta com esse aluno.

 

 

Alguns estudos indicam que o simples ato de ler já é de grande relevância para contribuir com a formação das pessoas, não interessando a ferramenta utilizada. Qual a sua opinião em relação a isso? E qual a importância da leitura para o desenvolvimento humano?

A leitura age como um elemento que trabalha a partir da experiência de outrem e que nos é repassada por meio da escrita. Ou seja: a leitura é a mediação entre a experiência daquele que escreve e o olhar daquele que a recebe, daquele que lê. Portanto, podemos compreender, a partir daí, o quanto a leitura auxilia na formação humana deste leitor, abrindo perspectivas para novos mundos e novas experiências proporcionadas pelas mais diversas narrativas. Um grande pensador das nossas letras, o crítico Antonio Cândido, dedicou um texto à relação da literatura com os direitos humanos, defendendo a tese de que a literatura é, ou ao menos deveria ser, um direito básico do ser humano, já que a fabulação atua na formação dos sujeitos. Para Cândido, a literatura se manifesta universalmente através do ser humano, e em todos os tempos, tem função e papel humanizador. Assim, esse hábito influi profundamente na constituição de nossa humanidade, assim como nos ajuda a agir de maneira mais cidadã, no sentido de respeitar as diferenças dos outros e pensar de maneira mais coletiva.

 Para finalizar, de que forma as novas tecnologias podem ser aliadas ao incentivo à leitura?

As novas tecnologias têm um papel fundamentalmente importante no nosso contexto atual: primeiro porque podem ser consideradas como praticamente inescapáveis. Nosso país é um dos que possuem mais alto nível de acesso às TDICs (tecnologias digitais da informação e da comunicação, com ênfase no acesso dos brasileiros às redes sociais). O nosso papel, enquanto educadores, é pensar de que modo nós podemos usar essas tecnologias positivamente, seja em sala de aula ou fora dela. Vou dar um exemplo da minha prática: trabalho em um campus no interior do Maranhão, de uma cidade ainda com baixos índices de desenvolvimento. Grande parte dos nossos alunos não tem condições de comprar livros ou tirar xerox diariamente para o acompanhamento das aulas, mas como o campus dispõe de wi-fi nós, professores, disponibilizamos textos em PDF que os alunos muitas vezes acompanham na tela de seus celulares. Isso é uma mostra de como a tecnologia atua a favor do trabalho do professor, e de quão bom proveito nós todos, professores e alunos, podemos fazer desse advento que nos proporciona tantos recursos. Obviamente que alguns alunos se excedem e acessam redes sociais no momento da aula, o que dispersa a atenção. Mas se o professor estiver atento aos usos diversos que pode fazer da tecnologia acredito que ela possa agir de maneira muito positiva no processo de leitura, de ensino-aprendizagem.