A neve e o aquecimento global

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Por Ivanildo Santos 18 de fevereiro de 2010

No final de 2009 e começo deste ano, a imprensa mundial noticiou uma série de fortes tempestades de neve que assolaram vários países da Europa e algumas regiões dos Estados Unidos. Norte-americanos e europeus tiveram problemas para se locomover com temperaturas bem abaixo de zero: estradas estavam intransitáveis, aeroportos e estações de trens ficaram fora de operação. Ironicamente, as primeiras ondas de frio e gelo anormais aconteciam no exato momento em que centenas de líderes mundiais estavam reunidos para discutir em Copenhague, capital da Dinamarca, durante a COP 15 – Conferência sobre Mudanças Climáticas como minimizar os efeitos nefastos que o aumento da temperatura média do planeta poderá trazer para a humanidade nos próximos anos. E pairou no ar a grande dúvida: diante desse cenário branco no Hemisfério Norte, será mesmo que o aquecimento global está acontecendo?

Para o climatologista Carlos Nobre, do Inpe – Instituto de Pesquisas Espaciais, não é possível afirmar que essas tempestades de neve fora do comum no Norte sejam algum indício de resfriamento da Terra. “Mesmo num planeta mais quente, essas ondas de frio sempre irão acontecer de tempos em tempos, especialmente na Eurásia e América do Norte. Não se pode tirar conclusões precipitadas antes de uma análise mais cuidadosa”, conta ele, que além de conselheiro do Planeta Sustentável é um dos cientistas componentes do IPCC – Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas e esteve presente na COP 15, em dezembro do ano passado. Para ele, as ondas de frio são consideradas pelos cientistas fenômenos meteorológicos naturais. “A Flórida, por exemplo, teve um inverno relativamente ameno, enquanto o Ártico tem registrado temperaturas entre 4º C e 8º C mais quentes”.neve_aquecimento_global

Nobre explica que a onda de frio no Hemisfério Norte se deveu a um fenômeno conhecido da meteorologia como “Oscilação do Ártico”. Normalmente, as pressões são mais baixas sobre o Ártico e os ventos de oeste sopram mais fortes, fazendo com que o ar mais frio fique contínuo sobre as altas latitudes. Porém, às vezes o Ártico é dominado por alta pressão atmosférica, como é o caso do episódio recente, fazendo com que o ar frio possa se deslocar com mais facilidade para as latides médias. Foi o que aconteceu e é um fenômeno da variabilidade natural do clima. “Alias, em 1911, a onda de frio foi tão intensa na América do Norte, por fenômeno similar, que toda a água das Cataratas do Niágara congelaram no inverno e as pessoas caminhavam sobre ela. Como já fazia um certo tempo que isso não acontecia, as pessoas acabaram se esquecendo”, diz o climatologista.

Se, de um lado, o Norte do planeta sofreu com as nevascas exageradas das últimas semanas, o Sul – em especial o nosso continente – tem sido castigado com uma grande quantidade de tempestades tropicais, com todas as suas consequências: transbordamentos de rios, alagamentos de muitas cidades e deslizamentos de encontas. “Ainda há um enorme debate entre a comunidade científica sobre a intensificação desses eventos climáticos no Sul, assim como também na maior ocorrência da categoria dos furacões superintensos. Embora seja preciso ter cautela nas análises, chuvas tropicais mais intensas podem, sim, ser resultado de um planeta mais aquecido”, admite o climatologista.