Cérebro é mais econômico do que se pensava
O cérebro humano é um escoadouro de energia inacreditável. Tomando apenas cerca de 2% da massa corporal, o órgão usa mais de um quinto da energia do corpo. Cálculos cada vez mais precisos do balanço da energia do cérebro no nível do neurônio (célula nervosa) são importantes para os pesquisadores, dos analistas de imagens por ressonância magnética funcional (fMRI) aos biólogos evolucionistas.
Há 57 anos atrás, os ganhadores do prêmio Nobel Alan Hodgkin e Audrey Huxley propuseram um modelo para calcular a energia entre as correntes eletroquímicas nos neurônios – um grande passo em direção ao entendimento de como o cérebro funcionava e como dividia recursos. O único problema era que o sujeito do estudo não era uma pessoa, nem mesmo um roedor. Era uma lula gigante. Agora pesquisadores encontraram um modelo mais preciso para cérebros de mamíferos que torna algumas de suas operações três vezes mais eficientes do que aquelas das equações baseadas na lula.
Para transportar a informação, os sinais químicos disparam através de trilhões de sinapses da célula cerebral (conexões entre neurônios). O modelo de Hodgkin–Huxley propôs uma divisão de 50/50 do uso da energia para os dois processos chave do axônio (o potencial de ação onde os íons estabelecem uma diferença de carga eletroquímica através da sinapse, uniformizando o caminho para sinais químicos; e o potencial pós-sináptico, a restauração do estado elétrico depois que um sinal químico é enviado).
O novo trabalho, relatado on-line na página da Science, propõe que em cérebros mamíferos a divisão seja de fato mais próxima a 15% para picos (potenciais de ação) e 85% para a modificação de sinapse subseqüente. Embora o uso de energia total pareça ser o mesmo, a divisão pode ter implicações importantes na compreensão de como os cérebros modernos se desenvolveram.
Como os mamíferos são capazes de armazenar tanta energia na extremidade frontal? O cérebro de lula de Hodgkin e Huxley disparou mais íons que se sobrepuseram, exigindo mais energia para restabelecer um diferencial eletroquímico. Os cérebros dos mamíferos, contudo, parecem estar bem distantes do movimento dos íons, diminuindo a quantidade de restaurações do diferencial de carga necessárias após a ação. “Quanto menos cargas você desloca, menos energia você precisa usar para restabelecer a graduação”, observa Pierre Magistretti (diretor da Escola de Ciências da Vida – Instituto da Mente e do Cérebro, no Instituto Federal de Tecnologia da Suíça, em Lausanne) que escreveu um artigo sobre acompanhamento de perspectivas na Science.
Os cientistas que estudam o cérebro muitas vezes dependem de cálculos de energia para estimar as localizações onde a energia é introduzida e consumida. “É difícil produzir números para estas estimativas”, afirma Arnd Roth, autor de estudo e pesquisador sênior no Instituto Wolfson para Pesquisa Biomédica da University College London. “A culpa não é deles”, observa ele sobre os pesquisadores que têm trabalhado de acordo com suposições agora refutadas.
As descobertas podem eliminar o “longo debate sobre qual desses processos consome a maior parte da energia”, observa Magistretti. Contudo, talvez ainda haja alguns descrentes: O novo estudo foi feito em ratos, mas Roth está razoavelmente confiante de que os resultados seriam semelhantes para seres humanos. “Temos agora outro modelo” para substituir meio século das velhas equações de Hodgkin-Huxley, afirma ele, acrescentando que, nos axônios dos ratos, “a forma é semelhante; as mesmas moléculas estão envolvidas, de forma que isso pode sugerir que eles devam comportar-se de maneira semelhante” em pessoas. Os testes de Roth e sua equipe foram limitados aos axônios no hipocampo, e ele observa que os axônios devem ser testados em outro lugar nos ratos para assegurar que o uso de energia é padrão através de todo o cérebro.
De que forma a nova proporção afetará a análise de imagens do cérebro também permanece discutível. Como observa Magistretti, “todas as técnicas funcionais de abordagens cerebrais que são usadas para explorar a atividade cerebral, fMRI ou PET (tomografia por emissão de pósitrons), medem o uso de energia em áreas que estão mais ativas do que outras”. Mas esses tipos de imagem medem esse tipo de uso de energia indiretamente e sendo assim, Roth afirma que “é problema do pessoal de fMRI levar isso em conta e decidir o que isso significa para as imagens que estão vendo”.
Por haver tamanha diferença em eficiência entre a lula gigante e os pequenos ratos, surgem grandes questões para Roth e outros interessados em como o cérebro se desenvolveu. “É curioso o fato de que na lula o uso da energia não parece ser ótimo”, afirma ele. A diferença pode ser, pondera ele, que a lula depende mais de seus neurônios para comunicar ações rápidas para escapar e assim sacrifica a eficiência da energia pela velocidade. Um viés em favor da eficiência poderia, por sua vez, ter permitido aos mamíveros evoluir para aperfeiçoar seus cérebros, caso respondessesm mais lentamente.
Tal proposta coloca outras questões: qual seria o índice de eficiência ideal? Quais são os outros intercâmbios, como a confiabilidade?
Enfim, parece estranho a Roth que um erro tão grande deve continue persistindo por anos depois que a prova foi possível. A versão da eficiência foi, porém, tão bem aceita que estava “subjacente à mente das pessoas, não manifesta”, afirma ele. Ninguém teve pressa em investigar: “Isso precisa ser assim? É uma lei da natureza?”