FAPEMA realiza estudo sobre efeitos da pandemia na pesquisa e produção acadêmica de mulheres e mães do Maranhão

Por Esdras 10 de junho de 2021

Há um longo e árduo caminho percorrido pelas mulheres no que se refere à inclusão no mercado de trabalho, em ambientes acadêmicos, na ciência e até mesmo nos meios de comunicação. São décadas de desafios femininos fruto de uma sociedade desigual, onde o papel da mulher, historicamente, sempre foi colocado aquém ao do homem.

O confinamento à esfera doméstica e o zelo pela vida familiar foram atividades direcionadas às mulheres que se perpetuaram por gerações, tornando-se uma espécie de cultura feminina. O isolamento social imposto implicitamente à mulher, devido aos cuidados com a casa, com os filhos, com o marido, afastava-a de qualquer outra atividade profissional ou educacional. O homem, assim, avançava a largos passos deixando rastros históricos de desigualdade, marginalização e exclusão feminina no meio social.

Mas, ao longo da história, as mulheres começaram a lutar por mais direitos, mais espaços, mais visibilidade na sociedade. Um dos marcos desse movimento, foram as reivindicações pelo direito ao voto, no início do século XIX, na Inglaterra. De lá para cá muita coisa mudou. Ou muitas lutas mudaram esse cenário. Porém, a batalha das mulheres para galgar os espaços merecidos ainda está longe de acabar.

Diante desse panorama, a Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico do Maranhão (FAPEMA) questionou-se: quais as complexidades e desafios que a pandemia da COVID-19 está causando na pesquisa e produção acadêmica de mulheres do Maranhão?

Na sociedade do conhecimento, na qual vivemos, a produção e distribuição de informação e de conhecimento são fundamentais para reduzir desigualdades sociais. Logo, compreender os desafios da mulher maranhense no ambiente acadêmico é importante para um questionamento mais profundo sobre as relações vividas nesse meio.

“As pautas femininas precisam ser colocadas em voga para que práticas negligenciadas ao longo da história sejam, de fato, revistas ou excluídas, dando lugar a uma transformação social”, frisou o presidente-diretor da FAPEMA, André Santos.

Dessa forma, a instituição realizou no período de 13 a 23 de maio de 2021, a pesquisa “Efeitos da pandemia na pesquisa e produção acadêmica de mulheres e mães do Maranhão”, com o objetivo de fazer um levantamento sobre as implicações da pandemia COVID-19 na pesquisa e  produção acadêmica das mestrandas, doutorandas, pós-doutorandas e pesquisadoras mulheres que atuam no Maranhão, com recorte especial para as que têm filhos.

No total, 170 mulheres responderam ao formulário com 12 questões, sendo nove de múltipla escolha e três de respostas abertas, que foi disponibilizado via Google Forms.  Ao todo, foram geradas 204 respostas textuais. A responsável pelo estudo foi a jornalista do Núcleo de Difusão Científica da FAPEMA, Walline Alves Guimarães.

Análise da Pesquisa

Mais de 80% das mulheres que estão à frente das pesquisas e produção científica do Maranhão são mães. A maioria é de cor parda, com 50,6%, seguida por pesquisadoras brancas, com 35,9%. Mulheres negras representam apenas 11,2%, conforme gráfico abaixo.

Gráfico 1: Raça/cor e filhos | Fonte: elaborado pelo autor/FAPEMA

As respondentes são, em sua maioria, oriundas de universidades federais, estaduais e privadas do Maranhão e atuam em diversas áreas científicas, com ênfase para as Ciências Humanas, Artes e Letras e Ciências Sociais Aplicadas, de acordo com o gráfico:

Gráfico 2: Instituição e área do projeto de pesquisa| Fonte: elaborado pelo autor/FAPEMA

A pesquisa aponta que, em 45% dos casos, a idade dos filhos está entre 1 e 6 anos, ou seja, dentro da chamada “primeira infância”. Esse é o período da vida que vai da gestação até os seis anos de idade, conforme conceito registrado no Marco Legal da Primeira Infância. Essa fase requer cuidados redobrados com a saúde (vacinas, idas regulares ao pediatra, alimentação saudável), além da necessidade de estímulos e interações interpessoais para que a criança tenha um desenvolvimento infantil pleno. No entanto, a maioria das mães pesquisadoras não tem rede de apoio diária para lhe auxiliar com os cuidados com seu filho.

Gráfico 3: Rede de Apoio| Fonte: elaborado pelo autor/FAPEMA

Ao serem questionadas se estão conseguindo trabalhar de forma satisfatória em seus projetos de pesquisa, de forma remota, 46,5% das mulheres responderam que conseguem de forma parcial e 36,5% afirmaram que apenas minimamente. Somente 7,1 % das pesquisadoras afirmaram realizar totalmente suas atividades de pesquisa.

Gráfico 4: Trabalho em projetos de pesquisa, de forma remota| Fonte: elaborado pelo autor/FAPEMA

Indagadas sobre o porquê de não estarem conseguindo realizar suas atividades de pesquisa remotamente, a maioria expôs que o motivo são os cuidados com os filhos e com o lar. Em seguida, o maior problema levantado pelas mulheres é a sobrecarga de atividades profissionais neste período de pandemia da COVID-19. A dificuldade em realizar a pesquisa de campo devido ao isolamento social também foi mencionada pelas respondentes.

“As demandas institucionais passaram a ser maiores durante a pandemia. Cancelei a ida de meu filho mais novo para a creche (estava com 2 anos no início da pandemia). Não consigo concentração para realizar atividades de pesquisa. Também não consigo buscar interlocutores para a investigação devido ao isolamento social”, pontuou uma das pesquisadoras.

Em outros depoimentos, duas participantes da pesquisa relatam acerca da dificuldade de conciliar atividades domésticas e de trabalho e ter concentração em casa, acarretando um cansaço perene. “Rotina sobrecarregada. Muito complicado conseguir a concentração e disposição necessárias para o trabalho, quando se está imerso em cuidados com o filho e atividades domésticas. A sensação é que não há descanso”; “Geralmente só consigo estudar depois que o meu filho dorme o que se torna muito cansativo, após passar o dia todo atendendo as necessidades da casa”, pontuaram.

Fatores, como os citados acima, fizeram com que a maioria das mulheres pesquisadoras não conseguisse cumprir com os prazos relacionados às suas pesquisas, conforme gráfico abaixo:

Gráfico 5: Cumprimento dos prazos relacionados às pesquisas| Fonte: elaborado pelo autor/FAPEMA

Além dos cuidados recorrentes com a casa e com os filhos, muitas pesquisadoras também mencionaram na justificativa em relação aos prazos questões como desmotivação e doenças psicológicas surgidas após o isolamento social. “(…) A situação da pandemia vem trazendo muitas dificuldades emocionais, que prejudicam na concentração e produção”; “Mentalmente e emocionalmente desmotivada, por falta de recursos financeiros para a pesquisa”; “Ansiedade, depressão”; “Problemas desencadeados pelo transtorno de ansiedade (…)”. Essas foram algumas das respostas para o não cumprimento dos prazos relacionados às pesquisas.

Por fim, questionamos sobre a submissão de artigos científicos no último ano. Um total de 46,5% das mulheres pesquisadoras não obteve êxito na submissão, por fatores semelhantes aos já mencionados anteriormente, acrescentado por problemas relacionados à própria pesquisa.

Gráfico 6: Submissão de artigos nos últimos 12 meses| Fonte: elaborado pelo autor/FAPEMA

“Devido a pandemia, precisei alterar o cronograma para a coleta de dados da pesquisa, e não consegui analisá-los a tempo de publicar um artigo no ano passado”, sublinhou uma das respondentes.

A partir das três questões abertas disponibilizadas no formulário “efeitos da pandemia na pesquisa e produção acadêmica de mulheres e mães do Maranhão”, foram geradas 204 respostas textuais, das quais elegemos quatro categorias de análises:1) Cuidados com os filhos e com o lar; 2) Falta de tempo devido à sobrecarga de atividades domésticas e profissionais; 3) Dificuldade para coletar dados da pesquisa; e 4) Problemas de saúde: estresse, ansiedade e depressão.

Consideramos que os problemas gerados a partir dessas categorias são os principais motivos que têm levado mulheres a não executarem as atividades relacionadas às suas pesquisas nos prazos estabelecidos ou mesmo a não conseguirem cumprir de forma satisfatória seus projetos. Tal fato pode gerar um processo de manutenção e legitimação de desigualdades no âmbito da academia neste período de isolamento social em decorrência da COVID-19.

Por: Walline Alves Guimarães | Revisão: Cláudio Moraes| Arte: Motta Junior