Missão lunar japonesa fornece vislumbre sobre formação da Lua
A principal hipótese sobre a formação da Lua sustenta que um gigantesco impacto há bilhões de anos fez com que uma enorme massa de material planetário fosse separada da Terra, que se aglutinou para formar nosso satélite.
No entanto, como concluíram pesquisadores que estudaram as amostras trazidas pela Apollo 11 em 1969, esse processo de coalescência não foi tranquilo – o calor da fusão deixou a Lua em formação coberta por um oceano de magma. Conforme esse oceano resfriou, seus componentes mais leves subiram para a superfície, formando uma camada externa que recobriu outras de rochas mais densas.
Recentemente, uma pesquisa geológica realizada utilizando-se dados coletados pela recém-desativada sonda Kaguya endossa a hipótese do oceano de magma, constatando que a camada superior da crosta lunar é, de fato, rica em rochas de baixa densidade de pureza excepcional. Os resultados da Agência de Exploração Aeroespacial Japonesa, responsável pela Kaguya, anteriormente conhecida por SELENE (Selenological and Engineering Explorer), foram publicados na Nature (a SCIENTIFIC AMERICAN faz parte do grupo editorial da Nature).
A sonda orbital Kaguya procurou por anortosito, um tipo de rocha composto essencialmente por plagioclásio, mineral de baixa densidade. A sondagem efetuada pelo orbitador descobriu que nas crateras e bacias jovens encontradas nas terras altas – terreno que constitui a maior parte da crosta lunar – o anortosito além de prevalecer era quase totalmente puro, isto é, a rocha era composta praticamente por 100% de plagioclásio. Os autores do estudo especulam que uma camada global da crosta lunar, de 3 km até 30 km abaixo da superfície, possa ser composta do excepcionalmente puro anortosito.
A quase exclusiva presença na crosta dessa rocha leve e flutuante indica um processo de formação idêntico através de toda a Lua, como um oceano de magma. Os resultados da Kaguya mostram que a formação de anortosito “é realmente um processo global”, observa John Longhi, petrologista do Observatório da Terra Lamont-Doherty, da Columbia University, e atualmente acadêmico convidado da Duke University, que não contribuiu para o estudo. “Embora eu tenha proposto outro modelo, essa pesquisa sugere que realmente não haveria outro meio para a formação da crosta lunar que não através do oceano de magma”.
Os comentários de Longhi são significativos, já que Paul Warren, geoquímico da University of California, em Los Angeles, o considera “o autor do modelo que mais se opõe ao do oceano de magma”. Nesse modelo, a rocha rica em plagioclásio elevou-se para a parte superior da crosta como resultado de um reaquecimento após a cristalização de um oceano de magma. Outras teorias descartam inteiramente a necessidade de um oceano de magma.
Warren, que não participou do estudo Kaguya, diz que a nova pesquisa sobre o anortosito “implica que deveria haver um processo incrivelmente eficiente de purificação desse mineral”. A predominância e pureza dessa rocha “não se coaduna com um modelo onde se tem coisas acontecendo de forma sequencial”, observa. “Tudo indica um processo global consistente, que é mais facilmente explicável pelo modelo do oceano de magma”.
Tanto Longhi quanto Warren guardam certo ceticismo sobre o extraordinário nível de pureza do plagioclásio no anortosito detectado pela Kaguya, mas sustentam que as implicações gerais continuam relevantes. Uma composição extremamente homogênea é praticamente impossível de se encontrar por meio de sensoriamento remoto da Lua, observa Warren, porque o solo lunar é composto de uma mistura de poeira que certamente contaminaria, até certo ponto, qualquer tipo de superfície. “Quaisquer que sejam as composições extremas que possam existir na crosta abaixo, certamente estão cobertas” pelo depósito de solo, acrescenta.
“Acredito ser um pouco difícil acreditar em tudo”, observa Warren a respeito do estudo da Kaguya. “No entanto, mesmo que os detalhes estejam um pouco exagerados, a importância do que eles obtiveram é notável”.