Pesquisa estuda danos genéticos causados por medicamentos contra leishmaniose e hanseníase

1 leishmaniose cutanea
Por Ivanildo Santos 29 de janeiro de 2015

1 leishmaniose cutaneaAs doenças negligenciadas representam, hoje, um dos principais problemas de saúde pública em países em desenvolvimento, como o Brasil. Causadas por agentes infecciosos ou parasitas, elas são consideradas endêmicas em populações de baixa renda, tendo, inclusive, indicadores alarmantes e investimentos reduzidos em pesquisas, produção de medicamentos e em seu controle.

Hanseníase, leishmaniose, malária, doença de Chagas e dengue são algumas das principais causas de morbidade e mortalidade em todo mundo.

Em alusão ao Dial Mundial de luta contra a Hanseníase, comemorado no dia 25 de janeiro, os dados da doença ainda assustam. Sabe-se que a incidência da hanseníase é alta no mundo inteiro, e que ainda hoje, acomete cerca de 250.000 indivíduos por ano, predominantementena Índia, Brasil e Indonésia. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), Brasil e Índia representaram 75,18% da prevalência mundial no ano de 2010.

No Brasil, em que 24.612 novos casos de hanseníase foram registrados somente no ano passado,os principais focos da doença estão nas regiões Norte, Centro-Oeste e Nordeste. Dentre os estados do Nordeste, o Maranhão possui o maior número de casos registrados, com cerca de 56 casos para cada 100.000 habitantes, sendo Imperatriz, o município que detém os maiores índices de detecção de novos casos. Nesta complicada estatística, o Maranhão se destaca também como o estado que possui o maior índice de prevalência de hanseníase no Brasil.

Apesar dos números expressivos, há pouca disponibilidade de medicamentos alternativos no mercado em combate a essas enfermidades. No Maranhão, o tratamento da hanseníase e também da leishmaniose é realizado por meio do uso de fármacos recomendados pela OMS e Ministério da Saúde, mesmo sendo reconhecidos os efeitos tóxicos de tais medicamentos.

Segundo a doutora em Ciências Biológicas, Silma Regina Ferreira Pereira, os mecanismos de ação desses fármacos também não são completamente esclarecidos, bem como a interação desses compostos com o material genético.

Foi com esse propósito que a pesquisadora do Laboratório de Genética e Biologia Molecular da Universidade Federal do Maranhão, juntamente com o seu grupo de pesquisa, desenvolve o projeto “Toxicogenética de Medicamentos Antileishmaniais eAntihansênicos”, que recebe apoio da FAPEMA, por meio do Edital Universal/2014.

O objetivo do estudo é avaliar o possível efeito genotóxico nos pacientes infectados e em tratamento contra ahanseníase e a leishmaniose, no Maranhão.

“Os efeitos tóxicos de muitas drogas são conhecidos. Esses efeitos podem ocorrer em diferentes níveis, afetando órgãos, tecidos, ou o material genético, alvo de nossos estudos. Os medicamentos, em geral, podem agir direta ou indiretamente no organismo, ou seja, alguns precisam ser metabolizados (processados) e seus metabólitos (subprodutos) podem interagir de diversas formas com as moléculas–alvo de modo a produzir um efeito desejado. Os medicamentos podem interagir com macromoléculas, como proteínas, açúcares, lipídeos ou ácidos nucléicos. O que nós temos estudado são os efeitos que estes medicamentos podem induzir nestes últimos, o DNA”, relata a pesquisadora.

O grupo de pesquisa de SilmaPereira já demonstrou, em artigo publicado em 2010 na revista Archives of Toxicology, que o Glucantime, droga de primeira escolha para tratamento das leishmanioses, causa danos ao DNA após ser metabolizado pelo organismo, quando é reduzido da sua forma pentavalente para a forma trivalente.

“Nossos resultados mais recentes têm demonstrado que o provável mecanismo de ação desta droga é por estresse oxidativo (dado publicado na revista Drug and Chemical Toxicology, em 2014). Existe uma estreita relação entre agentes que causam danos no DNA (chamados agentes mutagênicos) com o potencial carcinogênico dos mesmos. Daí a importância de avaliação de drogas disponíveis no mercado”, ressalta.

A pesquisa utiliza testes em animais, como camundongos (para realização de estudos in vivo) e também células humanas in vitro. Os efeitos desses medicamentos também têm sido estudados em células de pacientes que fazem uso dessas drogas. Todos os projetos desenvolvidos são primeiramente aprovados pelos Comitês de Ética em Pesquisa (Animal e Humano).

Além disso, outro propósito da pesquisa é encontrar alternativas que possam minimizar os efeitos colaterais desses medicamentos. “Da mesma forma que existem agentes que causam alterações no DNA, existem agentes que protegem o material genético desses danos, os chamados antimutagênicos,que podem ser encontrados em alimentos naturais (como betacaroteno, vitamina E, flavonoides, dentre ouros). Nossos trabalhos têm buscado encontrar alguns agentes que possam reverter o efeito do Glucantime em relação aos danos ao DNA. Os dados são promissores, mostrando que algumas isoflavonas, como a genisteína, são capazes de diminuir os danos ao DNA causados pelo Glucantime”, revela SilmaRegina Ferreira Pereira.

As doenças negligenciadas não têm recebido da indústria farmacêutica a devida atenção no sentido de inovar e melhorar a qualidade dos medicamentos oferecidos à população. Por isso, estudos como o desenvolvido pela pesquisadora da UFMA são importantes para investigar os reais efeitos tóxicos dos medicamentos disponíveis no mercado e a busca por medidas que possam reduzir ou reverter tais danos.

“A descoberta dos mecanismos de ação das drogas é um passo essencial para serem encontradas novas opções terapêuticas, bem como para se buscar alternativas de diminuir os efeitos colaterais e indesejados do medicamento. Nesse sentido, nossas pesquisas têm buscado conhecer os mecanismos de ação das drogas, mas também encontrar agentes que possam modular o dano causado ao DNA, sem com isso diminuir a eficácia do medicamento”, conclui.